O ano de 1977 teve
acontecimentos memoráveis. Foi quando o regime militar,
pressentindo o início de sua derrocada, aplicou um de seus
últimos golpes de autoritarismo. Antevendo uma estrondosa
vitória institucional da oposição nas eleições do ano
seguinte, o general-presidente Ernesto Geisel baixou o
Pacote de Abril – que criou a figura do terceiro senador
por estado, biônico, indicado indiretamente pelas
Assembléias Legislativas; limitava a um piso de seis e a um
teto de 55 o número de deputados por Estado, distorcendo a
representatividade federativa na Câmara; e ampliava para
seis anos o mandato do presidente da República, e que seria
o último da gestão verde-oliva.
Foi também um ano que
inaugurou um duro período para o coração alvi-verde do
paulistano Cosmo Legrazie. Além de marcar o fim a uma
série de 22 primaveras sem uma única conquista corintiana,
teria início um jejum de títulos pelo Palmeiras que
duraria outras 16 temporadas.
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Pente-fino
no DOE: durante quase três décadas na Apesp, o
polivalente Cosmo Legrazie cativou a todos com sua
seriedade e simplicidade |
Para a Apesp, porém,
foi um ano especial. Foi quando, já rodado em sua carreira de
contabilista, o Cosmo Legrazie inaugurou uma história de
dedicação e profissionalismo à associação. Em 1º de abril
de 1977, então com 54 anos e por um salário de cinco mil
cruzeiros, seu Cosmo ingressou no quadro de funcionários da
entidade na gestão do então presidente Milton Sampaio. Durante
esses 28 anos e oito meses encerrados neste 30 de novembro, foi
um dedicado e fiel companheiro.
De lá para cá, não
houve uma transição de diretoria que tenha prescindido de sua
valorosa experiência na administração da entidade. Conviveu
com diretores das mais variadas linhas de pensamento e
conquistou o respeito de todos. Ensinou, também, muitos
funcionários a cuidar do cotidiano da associação.
Com o ídolo palmeirense
Waldemar Fiúme – que em 16 anos no único clube em que jogou
começou como atacante, passou para o meio-de-campo e terminou
como quarto-zagueiro – seu Cosmo atuou em todas as posições
no que diz respeito à gestão da Apesp, do trato com as
questões orçamentárias e contábeis aos pequenos detalhes
administrativos do dia-a-dia. Agora, depois de passar muitas
bolas para os companheiros, vinha cuidando do pente-fino no
Diário Oficial do Estado, atento a toda e qualquer decisão
importante para a carreira e sua entidade de representação.
"Quando entrei
aqui, em 1995, passei a aprender tudo com ele. Das questões
práticas aos valores como honestidade, seriedade e
companheirismo. Com ele comecei a gostar de contabilidade e me
senti estimulada a fazer a faculdade de administração",
conta Kátia Cristina Moraes, que hoje responde pela área da
qual seu Cosmo cuidou por muito tempo. O sentimento de carinho
por seu Cosmo estende-se aos demais funcionários com quem
convive na sede administrativa da Apesp. A todos chama de
"Chuchu". Reciprocamente, tornou-se também mais um
"Chuchu" da casa.
Para o presidente da
associação, José Damião de Lima Trindade, Cosmo Legrazie
simboliza a respeitabilidade característica do conjunto dos
funcionários: "Temos uma equipe extremamente dedicada.
Tanto é que as diretorias passam e ela continua. Aqui o
companheirismo e o profissionalismo sempre prevalecem e o seu
Cosmo é uma referência para esse ambiente".
Já aposentado de
direito, Cosmo vai agora iniciar seu retiro de fato. Aos 83
anos, sua memória seletiva parece não ser inteiramente
simpática a essa expressão – "quando me aposentei? Faz
tempo, não me lembro" –, mas ele é sábio o bastante
para concordar que é hora de aproveitar a nova fase da vida,
com um merecido descanso.
Ele, que já circulou
pela Líbero Badaró de bonde, hoje é um adepto rigoroso do ato
de caminhar. Percorre a pé, quase todo dia, o trajeto de sua
casa na rua Capote Valente (próximo ao Hospital das Clínicas),
até o centro da cidade. Nos finais de semana e até mesmo em
alguns dias úteis, gosta de andar pela Paulista até o Parque
Trianon ao lado da mulher Isabel. Às vezes, na volta para a rua
da Consolação, dona Isabel segue para casa e seu Cosmo, para o
trabalho.
Agora o casal
terá mais tempo para as andanças dessa parceria que já dura
53 anos, para mais passeios ao litoral ("andar na praia é
muito melhor"), para os encontros com a filha Marilza e os
netos Felipe e Fernanda; e, quem sabe, algumas descompromissadas
partidas de baralho com amigos para passar o tempo. Bem, de
agora em diante, seu Cosmo, seu tempo é todo seu. Feliz vida
nova. E muito, muito obrigado por tudo.
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Companheirismo
e profissionalismo: marca da equipe de funcionários que
têm
em ‘seu’ Cosmo uma grande referência |