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Dez
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“É fundamental investir em mediação e conciliação”

 

Há 86 milhões de processos em andamento nos fóruns e tribunais do país. Quase um processo para cada dois brasileiros. Para dar conta do trabalho, o Brasil tem pouco mais de 16 mil juízes. Na média, são mais de 5 mil processos para cada juiz, mas não é necessário ser matemático para perceber que a conta é impossível de fechar. Muitas causas e poucos braços, que se somam à burocracia cartorária e ajudam a sedimentar a tão criticada lentidão do Judiciário brasileiro.

 

Uma das saídas mais eficientes contra o vagar judicial é impedir que cheguem à Justiça as causas que possam ser resolvidas com uma boa conversa ou políticas públicas que impeçam o litígio. Esse é um dos pontos centrais do trabalho do atual secretário nacional da Reforma do Judiciário, Marivaldo de Castro Pereira. “É fundamental investir na disseminação de meios alternativos para solução de conflitos, como é o caso da mediação e da conciliação”, afirma.

 

Em entrevista à revista Consultor Jurídico, concedida em seu gabinete no Ministério da Justiça, Valdo, como é conhecido, fez um diagnóstico das causas da lentidão judicial e apontou as soluções nas quais trabalha para que a Justiça seja demandada só nas causas que tenham relevância. O secretário, que está há menos de três meses no cargo, mas conhece a Secretaria como poucos, já arregaçou as mangas.

 

Sua pasta transformou em política pública um projeto criado no Tribunal de Justiça do Distrito Federal que forma líderes comunitários para mediar conflitos. “Como as pessoas das comunidades confiam nesses líderes, a ideia é capacitá-los com noções básicas de Direito, técnicas de negociação, e transformá-los em um instrumento útil para solução de conflitos evitando, muitas vezes, que as demandas cheguem ao Judiciário”, conta.

 

O secretário reconhece que o Poder Público é o maior responsável pela demanda e que o número de ações judiciais passa a falsa impressão de que há pleno acesso à Justiça no país: “poucos litigantes acabam monopolizando o Poder Judiciário”. Outra de suas frentes de trabalho é exatamente essa. “A maior parte das causas tem participação direta ou indireta do governo. Por isso é importante investir na criação de espaços no âmbito do poder público para debater a reformulação de procedimentos que tenham provocado a proliferação de demandas, cujo resultado já esteja pacificado nos tribunais superiores”, afirma.

 

Formado em Direito pela Universidade de São Paulo – instituição na qual também fez mestrado em processo civil – Valdo chegou ao posto que hoje ocupa aos 31 anos de idade depois de um longo caminho. Filho da união entre um pedreiro e uma diarista, morou em favelas e entrou na USP graças a um esforço pessoal incomum e ao cursinho da Poli, voltado para estudantes carentes.

 

Nascido em Brasília, mudou-se com a família para São Paulo ainda criança e trabalhou desde os nove anos para ajudar no sustento de casa. Voltou a Brasília em 2005, pelas mãos do advogado Pierpaolo Cruz Bottini, que havia acabado de assumir o posto que, hoje, é ocupado pelo próprio Valdo. Os dois haviam trabalhado juntos em São Paulo assessorando juridicamente movimentos de luta pelo direito à moradia na capital paulista.

 

Depois de atuar dois anos na Secretaria da Reforma do Judiciário com Bottini, Marivaldo Pereira foi para a Casa Civil trabalhar na sub-chefia para assuntos jurídicos, de onde saiu para assumir o atual cargo. Sua meta é adaptar algumas das políticas sociais que conheceu e ajudou a formular na Casa Civil à Justiça.

 

Leia a entrevista

 

ConJur — Passados seis anos da promulgação da Emenda Constitucional 45, da Reforma do Judiciário, um fato é incontestável: a Justiça continua lenta. Quais reformas ainda precisam ser feitas para atacar a morosidade?

Marivaldo de Castro Pereira — Os mais recentes levantamentos do Justiça em Números revelaram que houve um aumento de demanda. O Judiciário ganhou muito em produtividade, mas houve um aumento de demanda ainda maior. Isso significa que é fundamental investir na disseminação de meios alternativos para solução de conflitos, como é o caso da mediação e da conciliação.

 

ConJur — Como a Secretaria de Reforma do Judiciário trabalha para reduzir o número de processos na Justiça?

Marivaldo Pereira — Há diversas frentes de trabalho. Transformamos em política pública, por exemplo, um projeto que nasceu no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e foi premiado pelo Instituto Innovare. O projeto forma líderes comunitários para mediar conflitos. Hoje, temos quase 40 núcleos de formação de lideranças comunitárias em técnicas de mediação e conciliação. Como as pessoas das comunidades confiam nesses líderes, a ideia é capacitá-los com noções básicas de Direito, técnicas de negociação, e transformá-los em um instrumento útil para solução de conflitos evitando, muitas vezes, que as demandas cheguem ao Judiciário.

 

ConJur — O trabalho tem a supervisão do Judiciário?

Marivaldo Pereira — Pode ser em parceria com o Judiciário ou com outros órgãos. Por exemplo, assinamos recentemente um acordo com a prefeitura de São Bernardo do Campo (região do ABC paulista) para capacitar lideranças comunitárias. A mediação não precisa necessariamente da participação do Judiciário. Ela pode ser feita também na Justiça, mas não precisa passar pelo Judiciário, tampouco ser feita por um profissional do Direito. A mediação é um mecanismo por meio do qual as próprias partes buscam a solução do conflito. Logo, não é necessário ter um título para ser executado. Essa é a grande vantagem da mediação.

 

ConJur — O aumento do número de processos significa que o acesso à Justiça está sendo garantido?

Marivaldo Pereira — Ainda há uma deficiência muito grande no acesso porque poucos litigantes acabam monopolizando o Poder Judiciário. Esse é um dos pontos que precisam ser atacados para o aperfeiçoamento do sistema de Justiça.

 

ConJur — Como é possível atacar esse problema sem restringir o acesso ao Judiciário?

Marivaldo Pereira — Investindo na prevenção de conflitos, sobretudo no âmbito da administração pública. A maior parte das causas tem participação direta ou indireta do governo, seja federal, estadual ou municipal. Por isso é importante investir na criação de espaços no âmbito do poder público para debater a reformulação de procedimentos que tenham provocado a proliferação de demandas cujo resultado já esteja pacificado nos tribunais superiores.

 

ConJur — O senhor pode dar um exemplo?

Marivaldo Pereira — Um bom exemplo seria na área de previdência, onde qualquer divergência sobre o procedimento adotado pela administração pública pode dar origem a milhares de demandas, gerando um grande congestionamento do Poder Judiciário. A partir do entendimento contido nas decisões judiciais seria possível ajustar esse procedimento e, assim, evitar a proliferação de demandas. Isso já tem sido bastante incentivado pela Advocacia Geral da União. É fundamental um investimento pesado na prevenção de conflitos que, muitas vezes, podem ser resolvidos por meio do diálogo. É preciso também fazer com que cada um dos órgãos assuma a responsabilidade de ajustar condutas e aperfeiçoar seus procedimentos para evitar litígios.

 

ConJur — O Judiciário tem uma boa gestão?

Marivaldo Pereira — Existe um problema muito grande de formação dos atores do sistema de Justiça no que diz respeito à gestão da máquina pública. Houve um avanço grande graças à atuação do Conselho Nacional de Justiça, mas é preciso aprofundar esse debate, aproveitando a larga experiência que a administração pública tem em gestão. Como exemplo, poderíamos citar a realização de parcerias com a Escola Nacional de Administração Pública para a capacitação de servidores e membros dos órgãos que integram o sistema de Justiça. E não me refiro apenas ao Judiciário, mas também ao Ministério Público e á Defensoria Pública, que são áreas carentes em gestão.

 

ConJur — É preciso ter administradores de fato...

Marivaldo Pereira  — Exatamente. O magistrado, o promotor ou o defensor público não são formados para gerir. De repente, eles se vêem diante de uma máquina enorme para administrar, além de cumprir com todas as suas demais tarefas. Uma experiência do Poder Executivo federal que pode ser muito bem utilizada pelo sistema de Justiça é o da transparência. O Portal da Transparência foi um marco para administração pública federal ao permitir que o cidadão tenha acesso a dados referentes à execução orçamentária, compras, etc.

 

ConJur — Existe uma resolução do CNJ que obriga os tribunais a darem publicidade às suas contas, mas muitos ainda não cumpriram a determinação. Quais os obstáculos o senhor identifica para que o Judiciário aceite aderir a esses conceitos de transparência?

 

Marivaldo Pereira — É preciso sensibilizar os juízes sobre a importância desses mecanismos para a gestão, para o aumento da credibilidade dos órgãos públicos. No Executivo isso não foi feito do dia para noite. Houve um longo processo de construção. Surge com frequência a discussão sobre se determinada informação deveria ou não ser colocada no Portal da Transparência. O fato é que o resultado final foi fantástico. A administração recebe mais críticas quando é transparente, mas se aperfeiçoa. Certamente erros cometidos no passado deixaram de ser cometidos hoje por causa dessa transparência, por causa das muitas críticas que foram colhidas na própria página do governo.

 

 ConJur — Mas só modernizar a gestão resolve?

Marivaldo Pereira — Não. É preciso dar mais recursos financeiros ao Judiciário, modernizar procedimentos e atualizar a legislação processual. Existem processos que levam 20 anos para acabar. Veja o tempo que demora a solução de um processo de usucapião. Perceba o problema dos processos que envolvem licitações públicas. Há obras que ficam paradas por anos porque têm de esperar o resultado de um julgamento do Judiciário. Isso tem um custo grave para a sociedade, para o governo federal e para o crescimento do país. Perdem todos, porque, muitas vezes, quando a obra é liberada está deteriorada e boa parte tem de ser refeita.

 

ConJur — Desde a aprovação da Emenda 45, houve dois pactos com um conjunto de projetos para agilizar a Justiça. O que efetivamente mudou?

Marivaldo Pereira — O Pacto Republicano é uma das medidas mais marcantes da política de reforma do Judiciário adotada a partir de 2003. Houve um conjunto de propostas, tanto no primeiro quanto no segundo pacto, consensuais entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Muitas das propostas não são de autoria do Executivo. Já tramitavam no Congresso Nacional e foram selecionadas por serem consideradas fundamentais para a modernização do sistema de justiça. Tivemos muitos projetos positivos aprovados.

 

 

ConJur — Por exemplo?

Marivaldo Pereira — O que juntou as fases de conhecimento e execução dos processos. A atualização do julgamento pelo Tribunal do Júri, que reduziu substancialmente a morosidade nesse procedimento. A reformulação da Lei Orgânica da Defensoria Pública, que regulamentou a autonomia da instituição, previu a criação da ouvidoria externa e trouxe esclarecimentos sobre os direitos dos assistidos. Há outras medidas, como a separação e o inventário extrajudiciais.

 

ConJur — O STF se beneficiou com a reforma a partir da criação da Repercussão Geral e da Súmula Vinculante. É possível criar mecanismos semelhantes em relação ao Superior Tribunal de Justiça, como a Súmula Impeditiva de Recursos, que chegou a ser discutida?

Marivaldo Pereira — Existia um projeto de criação da Súmula Impeditiva de Recursos no primeiro Pacto Republicado. Essa discussão enfrentou alguma oposição. Mas considero uma medida importante e sua discussão deve ser retomada mais adiante. É um instrumento que não está descartado e pode ser bastante positivo para resolver demandas repetitivas.

 

ConJur — A multa por litigância de má-fé é um bom mecanismo para desestimular recursos desnecessários? Por que é pouco usada?

Marivaldo Pereira — É um instrumento importante, sim. E, de fato, é pouco usada. Mas o que eu vejo com certa preocupação é a ideia de criar barreiras econômicas para que o cidadão possa ter acesso a um recurso.

 

ConJur — Então, o senhor não concorda com o depósito recursal?

Marivaldo Pereira — Em algumas situações é bastante razoável exigir o depósito. Por exemplo, na esfera trabalhista, se não se exigir um depósito, corre-se o risco de quando o processo chegar ao fim não existir mais empresa para quitar a dívida. Há algumas situações atípicas em que você tem que zelar pelo interesse do hipossuficiente. No caso, o trabalhador. Mas há outras situações em que eu não vejo a política de aumento do valor das custas, do valor para recorrer, como uma política adequada para redução de processos. Porque, na verdade, nós estaríamos criando um muro, por onde só passa quem tem dinheiro.

 

ConJur — Mas já não existe um muro natural? Quem tem mais dinheiro contrata melhores advogados e é mais bem assistido judicialmente...

Marivaldo Pereira — Mas essa é uma barreira econômica. Por isso, corre-se o risco de criar mais uma barreira ao acesso à Justiça. Não é justo.

 

ConJur — Mas como combater, então, os recursos usados, claramente, para adiar o cumprimento de uma obrigação?

Marivaldo Pereira — Há muitas formas. Um projeto interessante que está parado na Câmara retira o efeito suspensivo da apelação, por exemplo. Ou seja, salvo em situações excepcionais, como de dano irreparável, a parte vencedora pode executar a sentença mesmo com o recurso em andamento. Infelizmente esse projeto enfrentou oposição e, hoje, estamos avaliando como retomar a discussão em torno dele no Congresso.

 

ConJur — Advogados têm reclamado que o novo Código de Processo Civil, aprovado pelo Senado e enviado para a Câmara, deixa os juízes com um poder muito grande de arbitramento dos honorários. O que o senhor acha disso?

Marivaldo Pereira — Na proposta original, a ideia era a de aproximar a fixação dos honorários contra a Fazenda Pública ao formato que se usa para a iniciativa privada. Há preocupação por conta do montante envolvido nas ações. Existem ações que envolvem bilhões de reais tramitando nos tribunais. É necessário dar um tratamento diferenciado em relação à Fazenda Pública, que resguarde o interesse público, porque, afinal de contas, esse dinheiro é da população. Não faz sentido usar dinheiro público para pagar honorários astronômicos. Obviamente que, da mesma forma, não se pode deixar de remunerar o advogado pelo trabalho desenvolvido. Essa é uma discussão que, acredito, no Congresso vai chegar a um bom termo para contemplar as duas partes. Ou seja, uma solução que resguarde o interesse público e o trabalho do advogado.

 

ConJur — Do ponto de vista de racionalização dos recursos processuais, como o senhor enxerga o projeto do novo código?

Marivaldo Pereira — Uma das sugestões que fizemos foi a de aproveitar os avanços trazidos pelas recentes reformas processuais. O processo civil é o campo em que tivemos os maiores avanços na política de reforma. Há questões que ainda precisam ser aprofundadas. Por exemplo, o incidente para julgamento de demandas repetitivas.

 

ConJur — Pesquisas que constataram que 80% dos processos judiciais se resumem a  não mais que 200 temas. Então, se for criado um incidente de julgamentos de demandas repetitivas praticamente se resolve o problema do acúmulo de processos.

Marivaldo Pereira — É importante que ao se identificar uma demanda repetitiva, seja possível solucionar a questão rapidamente, dando celeridade à tramitação de um conjunto de demandas que sejam representativas dessa controvérsia, a exemplo dos recursos repetitivos no STJ. Assim, em breve tempo teríamos uma decisão consolidada em um tribunal superior sobre aquela matéria. A partir daí, atribui-se a essa decisão o efeito impeditivo de recursos. A lógica que deve ser seguida é a seguinte: por que recorrer se eu já sei o resultado da ação no tribunal superior? Por isso, como alternativa ao texto original do projeto, estamos discutindo uma proposta que soma o procedimento do recurso repetitivo com o procedimento da súmula impeditiva.

 

ConJur — Para o senhor, como é possível medir e aplicar o princípio constitucional da razoável duração do processo?

Marivaldo Pereira — Varia de acordo com a situação, mas certamente cinco anos não é um prazo razoável para duração de um processo.

 

ConJur — Hoje, se um processo dura só cinco anos, é muito bom...

Marivaldo Pereira — No quadro de hoje, cinco anos é mesmo muito bom. Mas pensemos em ações que envolvam o estado da pessoa, ações de divórcio, de separação. Não tem cabimento uma ação como essa demorar mais de um ano.

 

ConJur — A situação é mais angustiante na área de família, não?

Marivaldo Pereira  — Sim. Ação de reconhecimento de paternidade. Ação de alimentos. Há processos em que seis meses é um prazo mais do que razoável, sobretudo se analisarmos a situação econômica da pessoa. A duração razoável varia conforme o poder aquisitivo também. Para uma pessoa mais pobre o processo tem um imediatismo muito maior, a pessoa tem uma necessidade muito maior de ter acesso ao seu direito. Então, a duração razoável depende da situação e é fundamental que o juiz tenha poderes para aferir essa situação. Aí o poder geral de cautela do juiz é muito importante, para que quando ele se deparar com essas situações possa conceder imediatamente a efetivação do direito, e não deixar que a demora e a burocracia acabem trazendo danos à vida das pessoas.

 

ConJur — Há grandes debates sobre até onde a Justiça deve interferir nas políticas de saúde pública ao conceder liminarmente o direito a tratamentos e medicamentos. Há muita reclamação de gestores no sentido de que ao cumprir uma decisão judicial e garantir determinado tratamento para um cidadão, o Estado deixará de aplicar o mesmo dinheiro para atender outras dez pessoas. Como solucionar esse fato?

Marivaldo Pereira — Essas decisões podem ter um impacto inverso. Temos discutido uma forma de aproximar o sistema de Justiça do SUA (Sistema Único de Saúde). O importante é que o juiz entenda o funcionamento do SUS exatamente para evitar que, ao conceder uma liminar para que um paciente tenha acesso a um tratamento experimental nos Estados Unidos, ele tire a hemodiálise de centenas de pacientes na outra ponta. Claro que se o medicamento está na lista do SUS e o paciente não consegue ter acesso, o juiz tem que conceder a liminar.

 

ConJur — Há trabalhos de esclarecimento nesse sentido?

Marivaldo Pereira — Existe uma experiência muito interessante em São Paulo. A Defensoria Pública paulista fez uma parceria com a Secretaria de Saúde do estado e trouxe para dentro da instituição um representante da Secretaria. Todos os casos que chegam à Defensoria são submetidos à avaliação de uma junta do SUS e discutidos antes de o processo chegar à Justiça. Isso reduziu drasticamente o número de demandas referentes à saúde no estado. Essa é uma política que interessa ao Ministério da Saúde, porque tem um custo menor. O custo da defesa é muito alto. Esse é o tipo de ação que pretendemos transformar em política pública no que diz respeito ao sistema de Justiça

 

Fonte: Conjur, 20/12/2010

 

 

 

 

 

Aumento no Legislativo & Desconforto no Judiciário

 

A Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil) reproduz em seu site reportagem publicada no jornal "Correio Braziliense" sob o título "Juízes exigem revisão do teto". O texto, de autoria de Leandro Kleber, traz o seguinte destaque: "Magistrados ameaçam recorrer ao STF para que também terminem o ano com reajuste garantido pelo parlamento".

 

Segundo a reportagem, o aumento de salário aprovado pelos parlamentares gerou um desconforto imediato do Legislativo com o Judiciário. A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) promete entrar com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) se a proposta de reposição salarial do teto do funcionalismo, hoje de R$ 26,7 mil, não for votada até o fim da próxima semana.

 

"É um absurdo e um desrespeito aprovar reajuste de membros do Executivo e do Legislativo, sendo que há uma proposta de reposição da inflação do teto sem ser apreciada no Congresso. Além de violar a Constituição, pois se trata de votação obrigatória, fere o princípio de independência entre os três Poderes", avalia o presidente da Ajufe, Gabriel Wedy. Hoje, têm direito ao teto os ministros do STF.

 

Fonte: Blog do Fred, de 18/12/2010

 

 

 

 

 

Judicialização da saúde exige nova forma de atuação

 

O Conselho Nacional de Justiça está levantando o número de processos judiciais que dizem respeito à saúde pública. O interesse na matéria surgiu depois que o Supremo Tribunal Federal realizou audiências públicas para discutir a tal "judicialização da saúde". A questão envolveu o fato de, na falta de remédios ou de tratamentos por parte do Estado, os juízes decidirem a favor do cidadão para garantir o direito constitucional à saúde. Com isso, os governos passaram a questionar tal interferência que, ao beneficiar um, prejudica a muitos.

 

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, disse, em evento na Escola da Magistratura do Rio de Janeiro (Emerj) que tratou da efetividade dos direitos sociais, ser possível que um grupo mais privilegiado, que tem acesso à informação e busca o Judiciário para garantir seus direitos, acabe se beneficiando das liminares concedidas tanto para um procedimento hospitalar quanto para a obtenção de medicamento. Ele reconhece que a discussão é muito complexa e que envolve não só o Direito como a política, sobretudo a questão da separação dos Poderes.

 

Entretanto, entende, é preciso imaginar novas formas de atuação, do contrário, os juízes continuarão a suportar críticas à atuação do Judiciário no que se refere ao tema. "É preciso que a questão seja discutida. O juiz não pode se furtar a desafios, mas precisa estar imbuído de arsenal de informações para não incidir em equívocos graves que possam afetar a universalidade do sistema de saúde", disse.

 

A Constituição é expressa ao dizer que a saúde é um direito de todos e dever do Estado. Para o ministro, a garantia, na prática, acaba levando a situações complicadas para o Judiciário decidir. Hoje, diz, há ações que pedem que a instalação de Unidade de Tratamento Intensivo em determinada região. Ele afirma que o tema angustia a todos os juízes. Se o município é acionado para prover dado tratamento, se vê às voltas com dificuldades de cumprir orçamento da saúde, devido à falta de recursos. "São questões delicadíssimas que se coloca para o Judiciário", disse.

 

Gilmar Mendes percebe um avanço no tema. Além da realização das audiências públicas, o ministro falou sobre ideia de criação de uma Câmara de Peritos para auxiliar o juiz na decisão sobre questões relacionadas a medicamentos, por exemplo, e que afasta a queixa comum de que o magistrado decide sem conhecer a realidade.

 

O ministro também citou o grupo de trabalho do Conselho Nacional de Justiça que sugeriu algumas medidas organizacionais a serem adotadas pelos juízes. No início de dezembro, durante o 4º Encontro Nacional do Judiciário, no Rio, o presidente do grupo do CNJ, conselheiro Milton Nobre, contou à revista Consultor Jurídico como estão as pesquisas sobre a judicialização da saúde.

 

Ele contou que tudo começou a partir das audiências públicas no Supremo Tribunal Federal. "O CNJ, diante do que se colheu na audiência, criou grupo de trabalho para, em complemento ao que tinha sido debatido, propor medidas para melhor solucionar esse tipo de problema."

 

Fonte: Conjur, 20/12/2010

 

 

 

 

 

É obrigatória a intimação de todos os executados em processo de penhora

 

É necessária a intimação de todos os executados em processo de penhora, mesmo que esta recaia apenas sobre os bens de um ou alguns deles. Esse entendimento é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que seguiu voto do relator, ministro Aldir Passarinho Junior, que determinou a anulação do processo a partir da penhora, exclusive.

 

No caso, os bens de um avalista foram penhorados sem que o devedor principal tivesse sido intimado. Ambos recorreram, tendo seus pedidos negados pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES). O tribunal considerou que não haveria obrigatoriedade de intimar todos os executados e que os prazos para interpor embargos de devedor já estariam vencidos.

 

No recurso ao STJ, a defesa do avalista afirmou que era nulo o julgado do TJES, pois o devedor principal deveria ser intimado da penhora. Também afirmou que o título de crédito teria sido adquirido de má-fé pelo executor da dívida e que o tribunal estadual não tratou da questão. Afirmou que, segundo o artigo 25 da Lei dos Cheques (Lei n. 7.357/1985), o avalista pode se opor à causa que deu origem ao título quando o portador o adquiriu conscientemente em detrimento do devedor. O devedor principal também afirmou haver nulidade no processo por não ter sido intimado.

 

Em seu voto, o ministro Aldir Passarinho Junior afirmou que todos os executados devem ser intimados, mesmo que a penhora seja apenas sobre alguns dos bens. “Isso é mais do que natural e justificado, na medida em que a defesa de um interessa aos outros, cabendo ação regressiva entre os devedores se um é forçado a pagar a dívida por inteiro”, observou. Esta é a jurisprudência pacífica do STJ.

 

O relator constatou um duplo cerceamento de defesa. Primeiro, ao afirmar que não haveria interesse para o embargo de devedor. E, depois, pelo fato de não ter havido a intimação do devedor principal. Com essas considerações, a Turma deu provimento ao recurso e ordenou a sua anulação desde a penhora, para que o exequente anteriormente não intimado possa oferecer embargos à execução.

 

Fonte: site do STJ, 18/12/2010

 

 

 

 

 

Supremo considera inconstitucional artigo de norma sobre criação e extinção de cargos do MP paulista

 

Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou parcialmente procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 932, ajuizada na Corte pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra dispositivos da Lei Complementar (LC) nº 667/1991, que dispõe sobre a criação e a extinção de cargos no quadro de pessoal do Ministério Público de São Paulo. Com a decisão, foi declarada a inconstitucionalidade do artigo 18 da norma, segundo o qual, “no mesmo processo ou procedimento não oficiará simultaneamente mais de um órgão do Ministério Público”.

 

Dos nove ministros presentes à sessão extraordinária desta sexta-feira (17), sete acompanharam o voto do relator, ministro Ricardo Lewandowski. No entendimento firmado pela maioria da Corte, o conteúdo do artigo 18 trata de questão processual e não meramente administrativa. Dessa forma, a Assembleia Legislativa de São Paulo, ao criar o referido dispositivo da LC 667, invadiu a competência privativa da União para legislar sobre direito processual, prevista no artigo 22, inciso I, da Constituição Federal.

 

Em seu voto, o ministro Lewandowski lembrou que o artigo 18 da norma teve sua eficácia suspensa quando da análise da medida cautelar na ADI. Em uma referência aos votos dos ministros aposentados Sepúlveda Pertence e Francisco Rezek no julgamento da liminar, ele destacou que o entendimento firmado naquela ocasião deveria ser mantido. “A norma do artigo 18, caput, da Lei Complementar 667 trata, evidentemente, de questão processual: a questão da pluralidade de membros do parquet [Ministério Público] atuando no mesmo processo”.

 

Apenas os ministros Cezar Peluso, presidente do Supremo, e Marco Aurélio votaram de forma divergente.  De acordo com eles, o artigo 18 da LC 667 não altera nenhuma norma de caráter processual, apenas as atribuições do Ministério Público.

 

Preliminar

 

Antes de julgarem o mérito da ação, a maioria dos ministros decidiu, por sugestão do relator, julgar se a ação estava prejudicada em relação ao artigo 18 da norma. Segundo a compreensão da Corte, o conteúdo questionado pela OAB no citado dispositivo foi integralmente reproduzido pelo artigo 114 da LC nº 734/1993, ou seja, não foi retirado do ordenamento jurídico, permanecendo em vigor, de outra forma, em outra lei que revogou a primeira.

 

A inconstitucionalidade do artigo 14 da LC 734 não foi, no entanto, analisada pelo Tribunal na sessão desta sexta-feira.

 

Artigos mantidos

 

Na ADI 932, a OAB também questionava a constitucionalidade de outros dispositivos da LC 667 (artigo 6º, inciso I, artigo 16, caput, e artigo 17, parágrafo único), que foram mantidos pela Corte.

 

Fonte: site do STF, 18/12/2010

 
 
 
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