07
Junho
10

A modernização da Justiça

Desde que a reforma do Poder Judiciário passou a ser discutida sem viés ideológico ou corporativo, a instituição vem sendo objeto de importantes mudanças destinadas a agilizar a tramitação dos processos, descongestionar os tribunais e reforçar a segurança jurídica no País.

Esse processo começou nos anos 90, estimulado pelas chamadas "reformas de segunda geração" patrocinadas pelo Banco Mundial. Foi aprofundado em 2004, com a aprovação da Emenda Constitucional n.º 45, que criou os Conselhos Nacionais de Justiça (CNJ) e do Ministério Público (CNMP).

Ganhou velocidade nos últimos anos, graças aos dois "Pactos Republicanos de Estado" firmados pelos presidentes dos Três Poderes, que criaram as condições para a modernização da legislação processual, tornando possível a implementação da súmula vinculante, do princípio da repercussão geral e da cláusula impeditiva de recursos.

Desde então a Justiça passou a trabalhar com estratégias de planejamento, metas de produtividade e projetos de informatização e incorporação da instituição à internet, enquanto o Congresso Nacional, além de propor a reforma dos velhos Códigos de Processo Civil e de Processo Penal, que já está em fase adiantada de tramitação no Senado, vem aprovando medidas destinadas a conferir maior racionalidade e objetividade às ações judiciais.

Nos últimos dias foram tomadas quatro iniciativas com esse objetivo pelos Três Poderes. A primeira delas foi a proposta de criação de um cadastro nacional de mandados de prisão e alvarás de soltura. A medida, que conta com o apoio do Ministério da Justiça e do CNMP, deverá estar implantada dentro de um ano e meio.  

Vinculada ao Sistema Integrado de Informações Penitenciárias e à Rede Nacional de Informações de Segurança Pública, a centralização dos mandados de prisão e alvarás de soltura por um banco de dados nacional agiliza o cumprimento de ordens judiciais, dando maior eficiência à repressão ao crime.  

A segunda iniciativa foi tomada pelo CNJ. Encarregado de exercer o controle externo do Judiciário, o órgão estabeleceu um rol de "tarefas mínimas" para a primeira instância das Justiças estaduais, federal, trabalhista e militar. A medida, que é complementar ao projeto de informatização da Justiça e conta com o apoio da OAB, tem por objetivo localizar os pontos críticos de cada tribunal, reduzir os custos administrativos da Justiça, implantar projetos de "governança corporativa" e permitir que as varas sejam administradas de modo mais profissional. 

A terceira inovação foi a aprovação, pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, de um projeto concebido para desestimular a litigância de má-fé. Elaborado pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, ele agiliza as intimações e aumenta de 1% para 50% sobre o valor da causa a multa aplicada aos advogados que juntam documentos já inseridos nos autos, com o objetivo de tumultuar o processo. Nos casos de embargos de declaração protelatórios, a multa passa de 20% para 50% sobre o valor da causa, na primeira ocorrência, e sobe para 100%, nas ocorrências seguintes. O projeto também determina que, nos atos processuais considerados protelatórios, impertinentes ou supérfluos, a parte prejudicada terá direito a uma indenização no valor de dez vezes as despesas com que teve de arcar para se defender.  

A última iniciativa foi a aprovação, também pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, de uma medida destinada a reduzir a duração dos processos trabalhistas. Votado em caráter terminativo, o projeto muda a Consolidação das Leis do Trabalho, passando a exigir da parte que recorrer ao agravo de instrumento o depósito judicial de 50% do valor do recurso contestado. O objetivo dessa inovação é coibir o uso abusivo do agravo de instrumento. De todas as ações recebidas pelo Tribunal Superior do Trabalho, em 2008, 74,8% eram agravos de instrumento, quase todos impetrados com fins protelatórios.

Depois de passar décadas sem se renovar, o Judiciário passa hoje por um veloz e oportuno processo de modernização.

Fonte: Estado de S. Paulo, de 7/05/2010

 

 


Governo paulista volta a ser acionista de 40% da Vasp

O Tribunal de Justiça de São Paulo anulou assembleia geral da Vasp, realizada em 1996, que aumentou o capital social da empresa por meio da emissão e incorporação de ações de duas empresas do Grupo Canhedo. A assembleia fez murchar a participação do estado de São Paulo que era de 40% para 4,61%. Com a decisão do Tribunal paulista, o Tesouro estadual voltou a ser acionista de 40% da Vasp.

O que poderia ser comemorado como uma vitória virou um grande abacaxi, diante do decreto de falência da Vasp e das dificuldades da companhia honrar seus compromissos com os credores. A Lei de Recuperação Judicial (Lei 11.101/05), conforme o seu artigo 2º, não se aplica a empresas públicas e nem a sociedades de economia mista. Ainda não se sabe como, na prática, a conclusão do tribunal vai entrar em vigor. 

A decisão, por votação unânime, é da 3ª Câmara de Direito Privado, que atendeu em parte ao pedido da Fazenda do estado. A turma julgadora negou ao Tesouro estadual o pedido de indenização por danos morais e patrimoniais, o que faria do estado também credor da Vasp e poderia injetar nos cofres públicos uma bolada milionária. 

Em 1990, a Voe Canhedo S.A. adquiriu em leilão 60% das ações da Vasp. Uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) foi instalada em 1992 para investigar a transação e o motivo do governo paulista ter pago US$ 53 milhões ao Consórcio Voe Canhedo, dias antes de a Vasp ser vendida ao mesmo grupo por US$ 45 milhões. 

Após a privatização, a empresa entrou em processo de sucateamento. Em 2005 foi decretada a intervenção na companhia aérea por decisão da 14ª Vara do Trabalho, que atendeu pedido formulado em ação civil pelo Ministério Publico do Trabalho. A Vasp entrou em processo de falência e recuperação judicial e, em 2008, por não cumprir o plano aprovado pelos credores, teve a quebra decretada pelo então juiz da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais, Alexandre Lazzarini. 

Manobra

O caso em julgamento envolveu pedido da Fazenda do estado contra a Voe Canhedo para anular duas assembleias gerais extraordinárias da Vasp, realizadas em junho de 1999. As assembléias aumentaram o capital social da companhia aérea, por meio da incorporação de ações de emissão de duas empresas do Grupo Canhedo (Brasília Táxi Aéreo — Brata — e Hotel Nacional), acionista majoritário e controlador da Vasp. O aporte de capital diluiu a participação da Fazenda estadual, que viu seu poder acionário minguar de 40% para 4,61%. 

Além da anulação do que foi deliberado nas duas assembleias gerais, o estado pediu indenizações por supostos danos morais e materiais. Em primeira instância, a 13ª Vara da Fazenda Pública julgou procedente os pedidos da Fazenda. Anulou as duas assembleias e mandou a Voe Canhedo pagar indenização por danos morais e materiais. 

A massa falida da Vasp e a Voe Canhedo entraram com recurso no Tribunal de Justiça para anular a sentença de primeiro grau. A corte, por votação unânime, reformou em parte a sentença. Manteve a anulação das assembleias, mas julgou improcedentes os pedidos de indenização. Pelos danos morais, a Fazenda do estado perdeu algo estimado em cerca de R$ 146 milhões. Os danos materiais deveriam ser apurados em liquidação de sentença. 

A turma julgadora entendeu que os danos materiais reclamados pelo estado era um “prejuízo imaginário”, pois nada foi demonstrado no processo. Os supostos danos morais foram negados com o argumento de que a lesão subjetiva não passava de desconforto político que não deveria ser reconhecido em relação a pessoa jurídica. 

A 3ª Câmara de Direito Privado entendeu que a única razão do estado consistia no dever de anulação das assembleias gerais da Vasp. Para os desembargadores, o voto da acionista controladora da Vasp, Voe Canhedo, deveria ser impugnado, pois teria sido proferido com abuso de direito. 

“Não prevalece mesmo a deliberação impugnada, notadamente em função de que a controladora, Voe Canhedo, por ostentar interesse conflitante com o da companhia, não poderia votar, de acordo cm previsão da Lei das Sociedades Anônimas”, afirmou o relator, desembargador Donegá Morandini.  

Ou seja, o tribunal entendeu que a Voe Canhedo não poderia deliberar sobre a incorporação das empresas Brata e Hotel Nacional, uma vez que estas companhias pertenciam ao mesmo grupo econômico. Esse quadro se caracterizou por conflito de interesses. O voto conflitante — emitido pelo representante da Voe Canhedo — foi decisivo na deliberação de incorporação das duas companhias e, portanto, passível de anulação. 

Quebra da Vasp

Em setembro de 2008, o juiz Alexandre Alves Lazzarini, da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo, decretou a falência Vasp, com o argumento de que a empresa não tinha condições de cumprir o plano de recuperação judicial elaborado depois que a Justiça do Trabalho determinou a intervenção da empresa. 

Um grupo de credores trabalhistas pediu a falência requisitando créditos que ultrapassam R$ 1 milhão. O argumento é o de que a Lei de Recuperação Judicial (Lei 11.101/05) prevê que quando o plano de recuperação judicial não é cumprido, deve ser decretada a falência do devedor. 

No caso, a Vasp se comprometeu a quitar as dívidas trabalhistas, já reconhecidas pelo juiz da falência, no prazo de um ano depois de assinado o termo de recuperação. Mas isso não ocorreu. 

O despacho que concedeu o processamento da recuperação judicial da Vasp foi dado em 7 de outubro de 2005. A decisão que permitiu a recuperação judicial da devedora foi concedida em 24 de agosto de 2006. A Assembleia Geral dos Credores que aprovou o plano ocorreu em 26 de agosto de 2006. Os funcionários tinham de receber o dinheiro até 24 de agosto de 2007. 

Hoje a Vasp tem uma dívida estimada em cerca de R$ 3,5 bilhões. A massa falida conseguiu arrecadar R$ 2 milhões com leilões de bens da companhia. A empresa chegou a ocupar a segunda posição no mercado aéreo. 

Os bens da companhia aérea começaram a ser vendidos em junho do ano passado. Nem todos os bens foram levados à venda.

Fonte: Conjur, de 4/06/2010

 

 


Nova súmula legitima penhora do imóvel-sede de atividade comercial

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovou súmula que permite a penhora da sede de estabelecimento comercial. A relatoria é do ministro Luiz Fux.  

Essa conclusão já estava sendo adotada pelo Tribunal, como por exemplo, no recurso especial n. 1.114.767, do Rio Grande do Sul, também da relatoria do ministro Luiz Fux. Nesse caso, o ministro considerou que “a penhora de imóvel no qual se localiza o estabelecimento da empresa é, excepcionalmente, permitida, quando inexistentes outros bens passíveis de penhora e desde que não seja servil à residência da família”.  

Em outro recurso especial, o de n. 857.327, a relatora, ministra Nancy Andrighi destacou que: “consoante precedente da Terceira Turma do STJ, o imóvel onde se instala o estabelecimento no qual trabalha o devedor – seja ele um escritório de advocacia, uma clínica médica ou qualquer outra sociedade – não está abrangido pela impenhorabilidade. Tal dispositivo legal somente atribui impenhorabilidade aos livros, máquinas, utensílios e instrumentos necessários ou úteis ao desempenho de qualquer profissão”.  

A redação da súmula 451 ficou definida nos seguintes termos: “é legítima a penhora da sede do estabelecimento comercial”. A súmula resume um entendimento fixado repetidas vezes no Tribunal. Após a publicação, os processos que se enquadrem na mesma situação vão ser analisados de acordo como estabelecido na súmula.

Fonte: site do STJ, de 5/06/2010




Comunicado do Centro de Estudos

O Procurador do Estado Chefe do Centro de Estudos, COMUNICA que os Procuradores do Estado que escolherem a Área da Consultoria Geral na sessão de escolha de vagas do concurso de remoção que se realizará no dia 10 p.f. serão oportunamente convocados para participação no Curso de Adaptação para a Área da Consultoria Geral, cuja programação provisória segue abaixo:

Local - Auditório da Escola Superior da PGE

Carga horária total do Curso - 18 horas

1º Dia - 14/06

09h00 - Abertura

09h30 - A Procuradoria Administrativa e o seu papel na

Área da Consultoria Geral

10h00 - Coffe Break

10h15 - Regime jurídico dos servidores públicos

11h00 - Informações em mandado de segurança

12h00 - Almoço

14h00 - Noções essenciais sobre os processos administrativos disciplinares 1

15h00 - Coffe Break

15h15 - Noções essenciais sobre os processos administrativos disciplinares 2

16h15 - A atuação da consultoria em matéria imobiliária

________________________________________

2º Dia - 21/06

09h00 - Noções essenciais sobre licitações 1

10h30 - Coffe Break

10h45 - Noções essenciais sobre licitações 2

12h00 - Almoço

14h00 - Noções essenciais sobre licitações 3

15h30 - Coffe Break

15h45 - Noções essenciais sobre licitações 4

________________________________________

3º Dia - 30/06

09h00 - Noções essenciais sobre contratos administrativos 1

10h15 - Coffe Break

10h30 - Noções essenciais sobre contratos administrativos 2

12h00 - Almoço

14h00 - Noções essenciais sobre contratos administrativos

3 - Contrato de concessão de serviços públicos

15h30 - Coffe Break

15h45 - Noções essenciais sobre convênios administrativos

e outros tipos de parceria

17h00 - Encerramento

Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I, seção PGE, de 3/06/2010



Comunicado do Centro de Estudos II

Para o “50º Congresso Brasileiro de Direito do Trabalho” no Centro de Convenções Rebouças – Av. Rebouças, 600, no período de 21 a 23 de junho de 2010, ficam deferidas as seguintes inscrições: Mirna Natália Amaral da Guia Martins, Fabiana Mello Mulato e Ricardo Rodrigues Ferreira.

Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I, seção PGE, de 3/06/2010

 




Despacho da Diretora, de 1º-6-2010

No Processo PGE 18620-674969/2008, em que o Dr. MANOEL JOSÉ DE PAULA FILHO, RG 30.037.693-5, Procurador do Estado N. II, ref. 3, requer a contagem de tempo no Ministério Público, em cumprimento à decisão judicial nos autos do mandado de segurança, perante a 4ª Vara da Fazenda Pública do Estado, processo 662.053.05.011836-9 (Apelação Civil 990.10.107631-4) fica deferido o período de 22/05/98 a 09/01/01, para fins de adicionais, sexta parte e licença prêmio.

Fonte: D.O.E, Caderno Executivo II, seção PGE, de 2/06/2010





"Vamos investir maciçamente em conciliação"

O caos do sistema prisional é uma chaga viva a incomodar a sociedade brasileira e a causar preocupações nos três poderes da República. O Executivo tenta combater o grave problema da superlotação com a construção de novas instalações. O Ministério da Justiça anunciou, recentemente, a destinação de R$ 500 milhões para criar 30 mil novas vagas nas cadeias públicas do país. Já o Judiciário, pelo Conselho Nacional de Justiça, criou o Mutirão Carcerário, um programa voltado para revisar prisões e supervisionar o funcionamento da Justiça Criminal. Desde 2008, o programa já colocou em liberdade mais de 20 mil detentos em situação irregular. 

Quem também está diretamente envolvida no enfrentamento à crise do sistema prisional é a Defensoria Pública. Com a atribuição constitucional de defender os interesses das pessoas carentes, a Defensoria tem como clientes as principais vítimas do caos prisional. Como bem mostrou o Mutirão Carcerário, são os pobres que acabam esquecidos nas prisões, mesmo depois de cumprir suas penas ou antes até de serem julgados. 

Em São Paulo, responsável por um terço da população carcerária do país, o problema está entre as prioridades da nova defensora pública-geral, Daniela Sollberger Cembranelli, de 42 anos. “Sabemos que essas pessoas vivem em condições desumanas, tratadas, às vezes, como verdadeiros bichos. A Defensoria quer investir seus esforços na questão da execução criminal para aquela pessoa que já tem direito de progredir de regime”. Desde 2008, a Defensoria Pública de São Paulo já entrou com mais de 5 mil Habeas Corpus para livrar da cadeia gente que não deveria estar presa. 

Casada com um promotor de Justiça - Francisco Cembranelli, que ganhou notoriedade por atuar com êxito na acusação do caso Nardoni - Daniela defende a competência da Defensoria para promover Ação Civil Pública, como uma forma de ampliar seu desempenho em favor dos desvalidos. "Essa possibilidade tende a racionalizar o trabalho da Defensoria". 

Daniela dedicou sua vida a defender pessoas carentes, mesmo quando a defensoria paulista não existia. Aos 25 anos, época em que ingressou na Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, tratou de trabalhar no serviço de assistência judiciária. “Eu me apaixonei. Eu era procuradora do Estado, mas logo quis ingressar na procuradoria de assistência judiciária da PGE”. Na função, a defensora passou a fazer defesas criminais no Tribunal do Júri. Por lá, passou 15 anos. “Lutar pela ampla defesa sempre foi minha bandeira.” 

Nesta entrevista à ConJur, Daniela Cembranelli fala sobre os desafios do futuro para a Defensoria Pública de São Paulo, explica como será sua gestão e anuncia seus planos para a fiscalização dos presídios pelos defensores. 

Leia a entrevista: 

ConJur — O que a defensoria pode fazer para levar Justiça para quem não tem acesso à Justiça?

Daniela Cembranelli — O papel do defensor é bastante amplo. Primeiro, a Constituição de 88 estabeleceu que uma instituição pública seria responsável pela assistência judiciária. A Constituição já muda o tema: antes a gente falava assistência judiciária, ela estabelece que é assistência jurídica. Prestar assistência jurídica para os necessitados é muito mais do que advogar para uma pessoa pobre. É também atuar extrajudicialmente. Além de patrocinar uma causa em juízo, pela lei, é atribuição do defensor público também promover a educação em direitos. Ou seja, primeiro conscientizar e depois motivar a população carente. O defensor público deve se aproximar das comunidades carentes, fazer cursos populares, buscar as pessoas mais vulneráveis para conscientizar que existem direitos. Também temos de fazer conciliação e mediação. Quando chega alguma pessoa para ser atendida na defensoria, o defensor deve chamar a parte contrária e tentar a conciliação. Porque essa é uma solução até para a pacificação social. O que nós queremos é não deixar que todo litígio se judicialize. 

ConJur — Evitar a judicialização dos conflitos é uma das bandeiras da defensoria?

Daniela Cembranelli — O meu projeto, nos próximos dois anos, é investir maciçamente na área de conciliação. Recentemente nós fizemos um concurso para o ingresso de servidores na defensoria especializados em assistência social e em psicologia. Queremos abrir núcleos de conciliação e mediação, com a participação de defensores públicos, assistentes sociais e psicólogos. É um trabalho sério, que deve ser feito por profissionais que têm habilidade na área. Eles farão cursos sobre conciliação e mediação pela escola da defensoria. Cada defensoria regional vai ter um Centro de Atendimento Multidisciplinar, o CAM,  com um psicólogo, um assistente social e um defensor público juntos, promovendo conciliação e mediação de conflitos. 

ConJur — A ideia é tentar a conciliação em todos os casos?

Daniela Cembranelli — Sim. Quando uma pessoa procurar a Defensoria Pública para ingressar com uma ação judicial necessariamente deverá passar pelo CAM. Vai conversar com o assistente social, o psicólogo e o defensor público, a outra parte será chamada, e a defensoria tentará promover a solução desse conflito de modo a não judicializá-lo. Essa é a parte mais relevante do meu projeto. Acredito que isso irá contribuir para um Judiciário mais rápido, ágil, por não levar demandas para ele. E também poderá solucionar conflitos de uma forma muito mais eficaz e pacifica. Vamos investir todos os esforços no Centro de Atendimento Multidisciplinar. 

ConJur — Qual é o orçamento para a criação do CAM?

Daniela Cembranelli — Estamos tentando trabalhar com a estrutura que temos. Conseguimos nos apertar e otimizar os nossos recursos da melhor maneira possível. Mas sem dúvida a defensoria precisa crescer em número de defensores. O governo está sensível a isso, tanto que no ano passado criou mais 100 cargos. Já fizemos um primeiro concurso e foi provida uma parte. Agora estamos no segundo e até o fim do ano 78 cargos serão providos. O edital já está prestes a sair. Em 2011, já precisaremos de outro concurso para prover mais cargos. 

ConJur — Qual seria o número ideal de defensores em São Paulo?

Daniela Cembranelli — Se você considerar que temos 2 mil juízes e 1,8 mil promotores na ativa acredito que deveríamos ter entre 1,5 mil a 2 mil defensores. Surgimos com 400, temos mais 100. 

ConJur — Falta muito ainda...

Daniela Cembranelli — Muito. Mas sabemos que esse é um processo paulatino, gradual, sabemos das dificuldades. Acreditamos muito na sensibilidade do governo para isso, por ser uma função social, voltada para a população carente. O pleito será de mais cargos já esse ano para que a gente possa fazer o concurso para o ano que vem, porque é demorado, tem que contratar empresa, fazer edital. 

ConJur — Como está organizada a Defensoria?

Daniela Cembranelli — São vários núcleos e esses núcleos são coordenados por um defensor público e tem a participação de outros defensores. Nos dividimos por área, há defensores que atuam só em VEC [Vara de Execução Criminal], outros só no crime [Vara criminal], em infância e juventude [Varas de Infância e Juventude], varas cíveis, varas de família. Temos também núcleos de Direitos Humanos, de Direito da Mulher, de Habitação e Urbanismo. Temos o Núcleo do Idoso, que vai cuidar também da questão dos deficientes. Há um núcleo contra todo tipo de preconceito, que trata de assuntos como homofobia. Vamos criar um núcleo de consumidores. 

Conjur — Qual a área que precisa de mais defensores?

Daniela Cembranelli — Pela Constituição, a prioridade deve ser dada à infância e juventude. Hoje temos defensores trabalhando em todas as Varas de Infância e Juventude, tanto na capital quanto no interior. É preciso cuidar da infância e adolescência justamente para ter um cidadão no futuro. Mas a Defensoria não consegue abranger todas as cidades de São Paulo, então é evidente que há lugares em que essa área está descoberta. Assim como a Vara de Execução Criminal é fundamental. A questão dos presídios no país inteiro é um grande problema e em São Paulo também. Em 2008, a Defensoria ingressou com cerca de 5 mil Habeas Corpus para evitar que prisões indevidas fossem decretadas, para impedir que pessoas que praticaram fatos de menor relevância, furto de bagatela, fiquem presas. 

ConJur — O direito individual deve prevalecer sobre o direito da coletividade?

Daniela Cembranelli — Não é disso que se trata. Porque para o coletivo é melhor que pessoa não seja encarcerada, porque indo para a cadeia certamente ela vai para uma escola de crime. Permitir que pessoas aguardem em liberdade seu julgamento não atinge a sociedade do ponto de vista negativo. É preciso lembrar que, pela Constituição, todo mundo é inocente até que seja condenado com uma sentença transitada em julgado. Hoje se prende porque a lei autoriza uma prisão instrumental, a prisão cautelar, que tem o objetivo de resguardar a instrução criminal do processo. Os juízes têm que ser mais rigorosos na análise de requisitos para a prisão cautelar. E, hoje, o que mais se vê são pessoas, que poderiam aguardar o processo em liberdade, presas. 

Conjur — A prisão cautelar muitas vezes usada como uma condenação antecipada...

Daniela Cembranelli — Com certeza. Às vezes, a pessoa fica presa pelo tempo que seria a pena e, no final do processo, é absolvida. Que tipo de perigo prepresenta para a sociedade o autor de um crime pequeno cuja pena é de um ano, um estelionatário, por exemplo? Claro que ela precisa de uma reprimenda, mas pode pegar uma pena alternativa, talvez doa mais para ela pagar uma indenização do que ser presa. 

ConJur — O que acontece com a pessoa que ficou presa cautelarmente durante um ano e depois é absolvida?

Daniela Cembranelli — Dependendo do caso ele pode até ingressar com uma ação de indenização contra o Estado. Se for uma pessoa carente, a Defensoria promove a ação de indenização. 

ConJur — E a defensoria incentiva a entrar contra o estado nesse caso?

Daniela Cembranelli — É um direito que é assegurado ao cidadão que ficou preso indevidamente e se ele tiver intenção de ingressar com ação de indenização a Defensoria promoverá a ação. 

ConJur — Como se resolve a questão dos presídios no país?

Daniela Cembranelli — Tem uma questão socioeconômica a ser enfrentada importante, mas a defensoria tem muito a contribuir sobretudo preocupando-se com a questão das condições de tratamento das pessoas que estão presas. Isso não pode continuar. Uma pessoa que está presa tem direito a sua dignidade. Não é porque cometeu um crime que deve ser tratada como um animal. Ela tem direito a saúde, a higiene, a comer, a dormir. E hoje o que nós vemos são pessoas que às vezes tem que se amarrar na grade porque não tem espaço na cela para poder dormir. 

Conjur — E o Estado diz que gasta R$ 2 mil por detento...

Daniela Cembranelli — Mas isso é uma questão de mentalidade, enquanto o Judiciário continuar mantendo presas pessoas que já poderiam progredir de regime nós vamos ter essa situação. Nunca vai ser suficiente, por mais que o Estado construa presídios, gaste com os presos, se não mudarem essa mentalidade de encarceramento não vai se resolver. O encarceramento não é uma solução para a criminalidade, mas a mentalidade é essa, porque as pessoas são refratarias à idéia de desencarcerar. 

ConJur — A Defensoria tem ajudado nos mutirões do CNJ?

Daniela Cembranelli — A Defensoria contribui com o trabalho do CNJ, que é um trabalho muito bom em relação aos presídios. Participamos de mutirões nacionais e até coordenamos um desses. Há um trabalho do CNJ junto com as Defensorias e o Condeg (Conselho Nacional de Defensores Gerais). 

ConJur — A senhora já participou de mutirão?

Daniela Cembranelli — Já. Fizemos um trabalho no Centro de Detenção Provisória de Pinheiros no ano passado para verificar uma situação de superlotação. 

ConJur — E como foi?

Daniela Cembranelli — Cada mutirão tem o seu foco. O que nós fizemos especificamente no ano passado foi ver a situação irregular de presos provisórios, ou seja, presos que estavam aguardando sentença e continuavam no CDP. Os nossos coordenadores de execução criminal têm, por lei, a atribuição de visitar estabelecimento prisional. 

ConJur — A vigilância da defensoria fez diferença em algum presídio?

Daniela Cembranelli — Só de o diretor da casa saber que a defensoria faz uma visita semanal ao presídio, já muda. No começo havia uma resistência para que a defensoria ingressasse nesses locais, alguns estabelecimentos exigiam que avisassem da sua ida antes. Mas, como isso é uma prerrogativa legal, conversamos muito com a Secretária de Administração Penitenciária até que foi acertado que não precisaria mais de avisar com antecedência. Hoje, o defensor entra tranquilamente. 

ConJur — E como é a relação da Defensoria com o Tribunal de Justiça de São Paulo?

Daniela Cembranelli — A conversa com a presidência do Tribunal de Justiça, hoje, é muito boa. Estamos negociando para fazer um sistema integrado de processamento de dados entre a Defensoria e o TJ, para que os defensores possam ter acesso aos processos de forma mais fácil. 

ConJur — A Defensoria está se preparando para o processo eletrônico?

Daniela Cembranelli — Já adquirimos o certificado digital para todos os defensores, o processo de licitação acabou, compramos e está na fase de implementação. Em Brasília, temos um escritório de representação, cujo coordenador, que é um defensor, já peticiona eletronicamente com essa certificação digital. 

ConJur — A Procuradoria do Estado de São Paulo tem reclamado do ativismo judicial. Na hora de decidir, o juiz tem que pensar no impacto econômico e social?

Daniela Cembranelli — Cabe ao Judiciário, sim, promover esse papel. O Supremo tem feito isso muito bem. Muitas vezes se supre até o papel do legislador para garantir direitos fundamentais. Não chamaria nem de ativismo judicial, mas de uma responsabilidade do Judiciário com o exercício dos direitos fundamentais de cada pessoa. 

ConJur — Ao pleitear competência para mover Ação Civil Pública, a Defensoria não está invadindo a área do Ministério Público?

Daniela Cembranelli — Não. Existe previsão legal para a Defensoria entrar com Ação Civil Pública, um instrumento importante para reunir várias demandas em uma única causa. Esse possibilidade tende a racionalizar o trabalho da Defensoria. Em vez de receber 50 moradores de uma comunidade carente, onde há um problema de saneamento e promover 50 ações, a Defensoria vai promover uma Ação Civil Pública em favor daquela comunidade.  

ConJur — Mas esse não é o papel do Ministério Público?

Daniela Cembranelli — É também. Mas não há que se falar em choque de interesses e de atribuições, porque os dois têm essa atribuição. O Ministério Público faz isso em favor de toda a sociedade e a defensoria faz no âmbito da tutela da pessoa carente. Esse é o diferencial.  

ConJur — Se o Ministério Público entrar na área de pessoas carentes vai invadir uma competência da Defensoria?

Daniela Cembranelli — Não. O MP pode também fazer. Há ações que são promovidas pelos dois conjuntamente. É uma somatória de forças para garantia de direitos fundamentais, da Defensoria e do Ministério Público que tem a prerrogativa de defender a sociedade.

Fonte: Conjur, de 7/06/2010

 
 
 
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