APESP

 

 

 

 

 

Defensoria de São Paulo nomeia 120 servidores

 

A Defensoria Pública de São Paulo vai nomear 120 servidores na quinta-feira (15/01). Os novos oficiais, aprovados no I Concurso feito pela instituição, devem ocupar 104 cargos que antes eram comissionados.

 

A função dos oficiais será auxiliar defensores públicos nas áreas administrativa e de atendimento ao público. A jornada de trabalho é de 40 horas semanais e o salário inicial é R$ 1,1 mil.

 

No dia da posse, eles escolherão as vagas de atuação. Depois, deverão passar por treinamento. O início da atuação está previsto já para esta sexta (16/1).

 

Com a contratação de novos funcionários, a Defensoria encerra o empréstimo de 67 servidores da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), que durou três anos.

 

Fonte: Conjur, de 14/01/2009

 

 

 


Carteira dos Advogados: um tema caro para a Classe

 

Há muitos anos alguns especialistas da área do Direito Previdenciário previam que a Carteira de Previdência dos Advogados poderia tornar-se inexeqüível. Muitos deles defendiam a tese de que a Carteira teria que ser fechada, porque quanto mais pessoas entrassem, pior seria. Contudo, ela permaneceu aberta e continuou o incentivo para que novos contribuintes passassem a integrá-la, o que, de certo modo, agravou ainda mais a sua situação. Cálculos atuariais feitos àquela época já apontavam alguns problemas, sendo o principal deles o acompanhamento puro e simples do reajuste da Carteira pelo salário mínimo, quando nenhum plano de previdência tem seu reajuste com base nesse índice.

 

Tudo isso foi agravado em 2003, com a Lei 11.608, que deixou de destinar 17,5% do total da arrecadação das custas judiciais, representando perda de 80% da arrecadação de receita da Carteira. Quando veio a lei, a advocacia deveria ter entrado imediatamente com uma ação na Justiça questionando como é que o Estado tira a principal fonte de custeio da Carteira e não coloca outra no lugar. Nada foi feito e a situação, que era difícil, tornou-se inviável. Mas onde estavam as entidades que nos representam? Por que nada fizeram? Haveria interesse de uma migração em massa para as OABPrevs? Por que os dirigentes das entidades de Classe não convocaram imediatamente os especialistas em Direito Previdenciário que compõem seus conselhos e comissões para debaterem o tema à exaustão? Afinal, este sério problema atingia em cheio a vida de 34 mil advogados e suas famílias, muitos deles contribuintes da Carteira há anos, tendo nela sua tábua de salvação para uma aposentadoria mais digna.

 

Outro problema veio algum tempo depois: a decretação do fim do Ipesp, que deverá ser extinto em junho do próximo ano (em conformidade com a Lei Complementar 1.010, mesma lei que criou o São Paulo Previdência — SPPrev). Assunto preocupante, na exata medida em que deixa no ar a pergunta: quem vai gerir a Carteira dos Advogados com o fim do Instituto?

 

Só mais recentemente, quatro ou cinco anos depois do derradeiro golpe desferido contra a Carteira, foi que surgiram algumas sugestões mais concretas por parte de lideranças da categoria. Fala-se na possibilidade de negociação com o governo do estado para que ele assuma a gestão da carteira; em aprovar na Assembléia Legislativa lei que prorrogue o funcionamento do Ipesp; e na entrega da gestão da Carteira para a Secretaria da Fazenda.

 

A extinção do Ipesp exigirá, é claro, a constituição de um gestor para a Carteira, que deverá ser definido pelas entidades de Classe.

 

Embora não seja especialista na área previdenciária, mas dada a importância do tema para a Classe, ouso fazer aqui algumas sugestões: constituição de um Conselho formado por aqueles que conhecem o assunto em profundidade para que estudem a situação e tirem desse encontro um documento que deverá ser apresentado à Classe com indicações dos caminhos a serem seguidos para solucionar o problema (levando em consideração os excelentes pareceres dos professores Wagner Balera, Arnold Wald e Adilson Dallari); que consideremos a possibilidade de terceirização da gestão da Carteira e da portabilidade para seus integrantes. Sendo que o mais importante é não deixarmos, sob hipótese nenhuma, a Carteira nas mãos do Estado, pois creio que basta a triste experiência que estamos vivenciando.

 

É importante também que as entidades responsáveis pelos destinos da Carteira, que sempre tiveram assento em seu Conselho, mantenham os advogados informados sobre suas decisões, iniciativas, ações, encontros e reuniões, utilizando-se para isso exaustivamente dos veículos próprios da categoria, para que se evite desse modo o uso político da situação, e também não se crie um ambiente de expectativa e preocupação para os advogados contribuintes, além daquelas que já os sobrecarregam no dia-a-dia do exercício profissional.

 

Rui Celso Reali Fragoso advogado, ex-presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo, ex-Conselheiro da OAB-SP, ex-Diretor da Faculdade de Direito da FMU-SP .

 

Fonte: Conjur, de 14/01/2009

 

 

 


Supremo deverá barrar lei da videoconferência

 

O presidente da República, mesmo em descanso, sancionou, transformando em lei, o projeto que previa a possibilidade de realização de interrogatório e outros atos processuais por sistema de videoconferência (Lei 11.900, de 8 de janeiro de 2009). A lei entra em vigor na data da publicação, ou seja, no dia 9 de janeiro do ano corrente.

 

O projeto original advém do deputado paulista Carlos Sampaio, ilustre membro do Ministério Público. Era seco. Durante a tramitação, foi recebendo emendas, transformando-se no texto final aprovado. Atende-se, com a publicação da lei nova, a reivindicação emanada sobretudo do estado de São Paulo, sabendo-se que já houve, nos setores competentes, provisão adequada a que o instrumental apto a videoconferências seja posto a funcionar na plenitude, havendo, é certo, experiências postas aqui e ali em uma ou outra vara criminal da capital do Estado. Há, nos debates, vozes entusiasmadas defendendo a implantação definitiva da novidade, nisto sobressaindo, na classe dos advogados, o culto ex-juiz Luiz Flávio Gomes, provavelmente habituado ao valimento da mídia eletrônica, pois trabalha habitualmente com o sistema (cursos virtuais).

 

Já houve oportunidade de experiência prática do sistema, destacando-se a ação penal número 977/2006, da 13ª Vara Criminal de São Paulo. Houve, no transcurso da audiência feita pelo método de videoconferência, episódio tragicômico, porque o técnico encarregado da aparelhagem, irritadíssimo, queria proibir o advogado de se movimentar, pois o causídico escapava à angulação das lentes. No contexto, os réus a serem interrogados se encontravam recolhidos em local diverso. Seus advogados estavam, fisicamente, próximos do juiz. Havia um telefone à disposição para que o defensor e seu constituinte se comunicassem. Aquilo tudo funcionava sinuosamente, assemelhando-se a uma ficção. Daí o uso, hoje corrente, da expressão “virtualidade”.

 

Poderia haver, em alternativa, a hipótese de o advogado estar no presídio, com o réu, correndo o ato de interrogatório e a própria instrução criminal a seiscentos ou mais quilômetros de distância, afastando-se o juiz do acusado e do defensor em igual dimensão. Mais ainda, encerrado o defensor nos limites do presídio, ficaria o mesmo privado de consultar os autos. Há muito, desde o surgimento da tentativa de inovação, os subscritores se põem contra a mesma, entendendo-a inconstitucional, porque, no frigir dos ovos, havia e há violação do artigo 5º, inciso LV, da Carta Magna.

 

Aliás, há várias medidas em tramitação no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça visando a demonstração de ofensa incidental à Constituição brasileira. Enquanto a disputa se acirrava no Poder Judiciário, o projeto de lei respectivo tramitava, assumindo, agora, forma impositiva, prevendo que o interrogatório de réu preso possa ser realizado em sala própria no estabelecimento em que estiver recolhido, desde que esteja garantida a segurança do juiz, do membro do Ministério Público e dos auxiliares, bem como a presença do defensor e a publicidade do ato.

 

Isso está no parágrafo 1º do artigo 185 do Código de Processo Penal, assim modificado. Bem examinada, a previsão referida é saudável, pois leva o juiz a um contato mais íntimo com o réu e com o cárcere, conhecendo-se a dificuldade existente na concretização de tal proximidade. De certa maneira a inovação estimularia o princípio da imediatidade, circunstância posta hoje objetivamente na Lei 11.719/08, mas de duvidosa execução, porque sempre se encontrará, no meio tempo, uma forma de suavisação da exigência, como tudo o que acontece no trato das garantias individuais.

 

O parágrafo 2º do artigo 185, posto na lei nova, permite ao juiz realizar, por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, o interrogatório de réu preso, desde que se pretenda prevenir risco à segurança pública quando exista fundada suspeita de que o réu preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento

 

Há outra hipótese para a opção, ou seja, aquela de se viabilizar a participação do réu no interrogatório se houver dificuldade relevante para seu comparecimento em juízo por enfermidade ou outra circunstância pessoal. Uma outra alternativa: impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do artigo 217 deste Código.

 

Por fim, há outra situação hipotética, consistente em texto esquisitíssimo: “... responde a gravíssima questão de ordem pública”. Quanto a tal dispositivo, pode-se entender que haja a preocupação de repercussões do fato na comunidade. Melhor explicação não há. Vale apenas, por enquanto, o horror deixado nos comentaristas pela extravagante crase posta no texto: “... responde à gravíssima questão de ordem pública”. Frente a tal excrescência, os subscritores conferiram o texto no Diário Oficial da União, verificando que o sinal gráfico ali está, lancetando o vernáculo. Obviamente, não compete ao Presidente da República verificar a exatidão do texto que subscreve, mormente estando em merecido descanso em paradisíacas praias brasileiras. Tocante à Lei 11.900, teria apenas determinado que sua assinatura eletrônica fosse aposta, merecendo lembrar que, embora sendo bom criador de metáforas, o dignatário não tem na gramática sua maior qualidade. Suas virtudes, de resto bem conhecidas, sobressaem com vantagem.

 

O parágrafo 3º do artigo 185 permite ao réu preso, quando for interrogado por videoconferência, acompanhar, pelo mesmo sistema, a realização de todos os atos da audiência única de instrução e julgamento de que tratam os artigos 400, 401 e 531 deste Código. Note-se a particularidade consubstanciada em “poderá acompanhar”. Isso significa que o recluso também pode não acompanhar, não se sabendo como, cuidando-se o interrogatório de meio de defesa e exercendo o réu, este sim a atividade defensiva, sendo o advogado um mero intérprete de tal comportamento, pode o acusado ser dispensado de tal participação. Na verdade, é da antiga jurisprudência que o réu preso precisa ser requisitado para acompanhar os atos de instrução. Aqui, o tratamento outorgado à indispensabilidade da presença do réu significa claramente que o acusado, no contexto, se torna um pacote incômodo que a lei, astutamente, procura colocar numa gaveta empoeirada, prosseguindo-se, pragmaticamente, na tramitação do procedimento.

 

No parágrafo 5º do artigo 185, a lei prevê a garantia ao réu do direito de entrevista prévia e reservada com seu defensor, prevendo-se, se realizado o ato por videoconferência, o direito a acesso a canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio e o advogado presente na sala de audiência do fórum e entre este e o preso. Cuida-se de escrito com interpretação nebulosíssima porque, em princípio, o texto parece afirmar que a comunicação telefônica se faria entre um advogado presente à audiência e outro posto no presídio e, em seqüência, uma comunicação entre o último advogado e o preso. Dentro desta alternativa, o recluso teria um defensor no presídio a ouvi-lo e outro advogado na audiência, comunicando-se os dois causídicos para depois — e só depois — o último preposto entrar em comunicação com o réu. Isto é cômico. Não se preocuparam os subscritores em saber qual foi o autor da extravagância, mas a hermenêutica judicial há de ter trabalho insano para assentar a inteligência do texto. Um esforço sincero de análise do teor do parágrafo referido pode levar à conclusão de que deve haver um advogado junto ao acusado, no presídio, e outro defensor no fórum, ambos cuidando da atividade defensiva, servindo o primeiro de intermediário entre o recluso e o segundo causídico. Os atos de comunicação seriam consubstanciados por uma linha telefônica reservada aos advogados e, obviamente, ao réu ausente, numa espécie de telefone vermelho.

 

Nas contingências do momento histórico vertente, com advogados sendo espiolhados nos parlatórios e nas comunicações com clientes, dificilmente um defensor terá tranqüilidade suficiente para se comunicar com o réu preso durante a instrução criminal, mesmo havendo garantia de manutenção da intimidade. Infelizmente, e independendo mesmo da confiabilidade que o Poder Judiciário pode e deve ter, há uma expressão popular afirmando que “gato escaldado não põe a pata em água quente”. É trágico, é dramático até, mas é peculiaridade que precisa ser muito bem assentada dentro da verrumação do texto questionado.

 

Os parágrafos sexto, sétimo e oitavo da lei nova cuidam, o primeiro, de fiscalização do sistema pelos juízes, pelo Ministério Público e pela Ordem dos Advogados; o segundo admite a requisição de réu na hipótese de não se realizar o ato por videoconferência; o terceiro amplia a videoconferência, permitindo-lhe a aplicação nas acareações, reconhecimento de pessoas e coisas ou inquirições. O parágrafo 9º garante ao acusado e seu defensor o acompanhamento dos atos processuais.

 

A alteração do artigo 222 do Código de Processo em vigor foi sancionada com dois vetos e promulgação do parágrafo 3º. Este, cuidando da oitiva da testemunha por carta precatória, admite a consumação via videoconferência, havendo aquilo que o intérprete pode classificar como ato de benevolência do legislador, afirmando-se que “é permitida a presença do defensor”. Prevê-se a possibilidade de realização da videoconferência por precatória no entremeio da realização da audiência de instrução e julgamento. Pretendeu-se, no contexto da lei nova, enfrentar, em atividade processual manquitolante, as modificações trazidas pela Lei 11.719, enquanto se pretende, ali, a concentração do procedimento numa audiência só.

 

No entretempo, prevêem os subscritores desta síntese uma tarefa hercúlea a ser desenvolvida na Suprema Corte. Percebe-se, na verdade, que o Supremo Tribunal Federal tem, hoje, sobremaneira, a missão de manter os paradigmas estipulados na Constituição Federal. O Estado Democrático de Direito tem seus termômetros balizados, sobretudo, nos indicadores do tratamento outorgado ao Direito Penal e ao procedimento persecutório. Sempre foi assim. Quando se pretende saber qual a vocação democrática ou autoritária de uma nação, pesquisa-se a maneira pela qual as perseguições são materializadas e a atividade defensiva é garantida.

 

O Estado brasileiro vem correndo muito sério risco de desequilibrar, ideológica e concretamente, as relações entre o Poder e a cidadania. Verifica-se isso com a investida irada contra as garantias constitucionalmente outorgadas ao cidadão, desviando-se a perseguição reiteradamente no descarnamento da intangibilidade do advogado enquanto se laceia, com enorme dose de falta de vergonha, a imaculabilidade do segredo profissional.

 

O Brasil, nesta peculiaridade, vai muito mal. Tocante ao aspecto ideológico, o próprio cidadão foi convencido de que circunstâncias ligadas a uma ou outra hipótese acusatória podem justificar a restrição às prerrogativas constitucionalmente asseguradas, instilando-se entre os próprios juristas, muito deles respeitados, o veneno do denominado “Direito Penal do Inimigo” ou, para alguns, o sinônimo de “Direito Penal do Autor”. Isso é coisa velha. Vem, entre outras ideologias corrosivas, do neo-socialismo nazi-fascista. Os jovens juristas brasileiros correm, inclusive, risco sério de contaminação dessa vertente significativa de um vitupério ao Direito Penal clássico.

 

As observações derradeiras se entranham nas justificativas postas no próprio projeto de origem. Admite-se, ali, que o Estado-Acusação não tem meios materiais para a imposição de celeridade aos processos, resultando disso relaxamentos de prisão e prejuízo sobre o acusado. A admissão de tais defeitos transforma o Estado, sim, em ativador de uma outra espécie de auto-delinqüência (pessoas jurídicas se alheiam ao Direito Penal), porque o retardamento do trato dos direitos do preso constitui, o mais das vezes, exercício arbitrário de função pública ou abuso de poder.

 

Não pode a autoridade exigir comportamento adequado dos jurisdicionados enquanto se comporta com agressão aberta e direta à própria lei que lhe delimita a atividade persecutória. Angustiadamente, percebem os intérpretes que o conflito entre o perseguidor e o perseguido transforma uns e outros em duas classes de infratores, empunhando cada qual a bandeira de uma cor diversa. Resta à Suprema Corte, insista-se, encargo poucas vezes divisado na história da nação, ônus este que vem sendo cumprido com imensa galhardia, resistindo os ministros a agressões insidiosas e tentativas fortíssimas de denegrimento da toga dos juízes, agressões estas advindas, agora, de um ou outro legislador ansioso por quebrar, insanamente, a vitaliciedade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

 

A legislação correspondente à videoconferência é exemplo típico da confissão de negligência no tratamento outorgado aos presos brasileiros. Nunca, no Brasil, houve porcentagem maior de condenações em alternativas atinentes a crimes graves.

 

O Poder Judiciário brasileiro, ressalvadas exceções que, por serem exceções, são minoritárias, tem na conduta jurisdicional, seguidamente, o influxo do medo. Alguém já afirmou – os subscritores não se lembram de quem foi – que o medo incha como o almoço desavisado ou vinho de má estirpe. O medo da crítica, o pavor da investida desonrosa, o receio da increpação de má-conduta é dos piores defeitos que o magistrado pode ter. Nesse diapasão, o Supremo Tribunal Federal tem comportamento absolutamente imaculado. Dentro da advocacia criminal, advogados e juízes não podem ser ligados por laços outros que não sejam o respeito mútuo, a elegância e a educação.

 

Em outros termos, as relações entre uns e outros nem sempre são cordiais. Vale, entretanto, a análise externa da forma pela qual os magistrados se apresentam à coletividade. Já se disse isso e já se escreveu outro tanto na literatura atinente à espécie. Agora, repita-se, a Suprema Corte brasileira desenvolve com extrema proficiência a tarefa de manter intocados os pressupostos que fazem da nação um Estado Democrático de Direito e não servo do autoritarismo insuflado pelos ares de padrões advindos do Velho Mundo. Um dos sintomas do combate é, certamente, a lei que instituiu a videoconferência. O Supremo Tribunal Federal saberá lidar com isso. Para melhor interpretação do conflito jurisprudencial existente, leia-se o Habeas Corpus 88.914-0, de São Paulo, sendo relator o ministro Cezar Peluso e impetrante a advogada Patrícia Helena Massa Arzabe.

 

Paulo Sérgio Leite Fernandes é advogado criminalista em São Paulo.

Rogério Seguins Martins Junior Advogado criminalista

 

Fonte: Conjur, de 14/01/2009

 




Defensoria Pública, três anos

 

Neste último dia 9 de janeiro, comemorou-se o terceiro ano da criação da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, pela promulgação da Lei Complementar Estadual nº 988/2006. Fruto da luta de centenas de entidades da sociedade civil, iniciada em 2002, a criação da Defensoria em São Paulo veio suprir a omissão do Estado, que, após 18 anos da Constituição federal, era a antepenúltima Unidade da Federação que ainda não havia criado a instituição responsável pela prestação de assistência jurídica às pessoas carentes.

 

A demora, ao menos, permitiu que a lei afinal aprovada fosse a mais avançada do Brasil, criando não apenas um "escritório de advocacia para pobres", mas um órgão preocupado com o fortalecimento da cidadania das pessoas. É com este espírito que a Defensoria tem como missão o ensino e a conscientização da população excluída sobre seus direitos, realizando orientação preventiva com vista à prevenção de conflitos, bem como prestar atendimento interdisciplinar, procurando enfrentar os problemas vividos pelas pessoas não apenas na sua faceta jurídica, mas também social e psicológica, além de atuar na defesa coletiva dos grupos sociais vulneráveis, inclusive por meio de ação civil pública nos casos em que as violações são graves e atingem grande número de cidadãos.

 

Por outro lado, a Defensoria de São Paulo apresentou-se como a mais moderna e transparente instituição jurídica do País, pois criou inéditos mecanismos de participação da sociedade civil na sua gestão e fiscalização. É o primeiro órgão jurídico do Brasil - seja tribunal, Ministério Público ou qualquer outro - a ter uma Ouvidoria ocupada por pessoa de fora da carreira, indicada por entidades de direitos humanos para participar da gestão da instituição e da fiscalização da qualidade dos serviços prestados. A Ouvidoria conta com assento permanente no Conselho Superior do órgão e recebe e encaminha críticas e sugestões dos usuários e da sociedade. O plano anual de atuação da Defensoria Pública - que define a estratégia e as metas de atuação da instituição e norteia também sua proposta orçamentária - é instituído a partir de conferências regionais e estadual, realizadas a cada dois anos, que envolvem os defensores públicos e um sem-número de entidades organizadas e cidadãos.

 

Mas a Lei 988/2006 não criou a Defensoria Pública do sonho dos paulistas. Compreendendo-se que se dá um passo de cada vez, a sociedade civil paulista comemorou a aprovação da referida lei mesmo sabendo que o número de defensores nela previsto - 400 - era extremamente insuficiente para atender à demanda de todo o Estado, que tem cerca de 2.200 juízes e desembargadores e 1.700 promotores e procuradores de Justiça, nas suas mais de 360 comarcas. Acreditou-se, naquela época, que o governo do Estado iria, paulatinamente, ampliando o número de defensores, bem como igualando seus vencimentos aos níveis das demais carreiras jurídicas estaduais.

 

Infelizmente, o governo José Serra, que se iniciou em 2007, quando a Defensoria estava completando um ano, não honrou essa expectativa. Hoje, os 400 defensores públicos do Estado nem sequer conseguem dar conta de todos os processos nas 22 cidades em que estão presentes. Nas demais cidades, a Defensoria é obrigada a custear um convênio firmado pelo governo do Estado há cerca de 20 anos, para pagar advogados particulares que aceitam defender as pessoas pobres. Esse convênio tem custado, em média, quase R$ 300 milhões por ano, enquanto o salário dos 400 defensores não chega a um sexto disso. Em outras palavras, com esses R$ 300 milhões seria possível designar o número necessário de defensores públicos em cada comarca do Estado e ainda se economizaria dinheiro público. Mas a criação de cargos de defensor público é ainda de competência exclusiva do governador, que, sem apresentar nenhuma justificativa, simplesmente ignora um anteprojeto enviado pela Defensoria desde maio de 2008 prevendo a criação gradual de meros cem cargos de defensor por ano, pelos próximos quatro anos. Sem mais cargos, a Defensoria permanece nesse círculo vicioso, no qual não pode ampliar seus serviços e tem de gastar cada vez mais dinheiro com o convênio com a OAB-SP.

 

É assim que se "comemoram" os três anos da Defensoria Pública, que, apesar do avanço da idade, mantém o mesmo tamanho dos anos anteriores - o mesmo, não, porque também tem sofrido com a saída constante de defensores públicos recém-nomeados. Nestes três anos, já se evadiram quase 80 ingressos, cerca de 20% da carreira, que procuram outros concursos com salários melhores, pois um defensor público ganha menos de um terço que um juiz ou promotor e metade do que ganha um procurador do Estado.

 

A Defensoria Pública tem muito a mostrar e a comemorar nestes três anos, como inúmeras ações judiciais coletivas garantindo o direito a creche de milhares de crianças e impedindo o despejo abrupto de milhares de famílias; a atuação extrajudicial no caso da cratera do Metrô em São Paulo, que beneficiou quase todas as famílias atingidas; sem contar que 75% dos habeas-corpus concedidos pelo Superior Tribunal de Justiça foram impetrados por defensores públicos paulistas.

 

Enquanto não houver ao menos um defensor público em cada comarca do Estado, atuando ao lado dos juízes e promotores, o valor do acesso universal à Justiça se manterá inalcançável. Há ainda pouco a comemorar quando as pessoas pobres que moram em 93% das comarcas do Estado nunca viram - nem vão ver tão logo - um defensor público na frente.

 

Antonio José Maffezzoli Leite, defensor público, ex-terceiro subdefensor-geral do Estado (2006-2007), foi coordenador do Movimento pela Criação da Defensoria Pública em São Paulo

 

Alberto Silva Franco, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo, foi presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais

 

Fonte: Estado de S. Paulo, seção Opinião, de 14/01/2009